Alaru, pan-africanista, linha de
frente contra o racismo
21/12/19 por Kaique Dalapola para
o Ponte Jornalismo.
Professor de história e fundador
da União dos Coletivos Pan-Africanistas (UCPA)
Formado em História desde 2007,
dizia que sua faculdade era a luta, as ruas e as praças. Lecionou na zona leste
paulistana em escolas municipais e estaduais, além de dar aulas em cursinhos
comunitários pré-vestibular.
Em agosto de 2000, quando editava
o jornal autônomo Filhos da África, juntou com membros de outros cinco
movimentos para formar a UCPA com o objetivo de difundir o pan-africanismo e o
fortalecimento do povo preto de forma autônoma, sem vínculo com ONGs, partidos
políticos, sindicatos e empresas.
“Na época, queríamos provar a
possibilidade de fazer luta em prol da comunidade preta sem estar atrelado a
outras instituições. Queríamos ter o controle de nossas narrativas e agendas”,
conta o professor Abisogun Olatunji, de 37 anos, que esteve com Alaru desde o
começo da UCPA.
Companheiros de movimento
destacam que Alaru foi responsável por ensinar uma geração de jovens pretos a
ter autonomia na luta contra o racismo e atuar intransigentemente contra a
supremacia branca
“Alaru era um grito, um professor
para cada preto e preta que luta diariamente pela dignidade de nosso povo. Foi
uma perda irreparável”, diz o assistente jurídico Wesley Nascimento, 27 anos,
que militou no mesmo movimento que ele por cerca de um ano.
O militante negro Jomo Akanni, de
46 anos, destaca que Alaru “sempre pautou a luta coletiva como o mais
importante”. Parceiros de luta durante 17 anos, Akanni lembra que o professor
“criou o termo pan-africanista por essência, que seria um reconhecimento a
irmãos e irmãs que, apesar de não se denominarem seguidores do pan-africanismo,
tinham o amor ao povo preto como pilar de vida”.
O ativista negro Kairu Kijani, de
22 anos, diz que Alaru “foi muito dedicado e com muita disposição na luta,
acolhedor e carinhoso na forma de tratar os irmãos”. Afirma ainda que o
professor “ensinou a amar o povo preto e lutar por todos os meios
necessários”.
Para Wesley, “era incrível
observar os jovens por volta dos 18 anos que ficavam em silêncio para ouví-lo,
pois todos tinham consciência do aprendizado que teriam com ele”. Eles se
conheceram durante protestos pela liberdade
do ajudante Igor Barcelos Ortega.
Em uma manifestação pela
liberdade de Igor, que também apontavam racismo nas prisões da modelo Babiy
Quirino e do educador Marcelo Dias, em setembro do ano passado, Alaru foi o
responsável por puxar um jogral no fim do protesto.
“Nós não podemos acreditar em
promessas de partidos políticos, a justiça não é cega, a justiça é branca e
racista. Nós temos que nos organizar, entre nós, em nome de uma única bandeira,
a bandeira do povo preto. Lutar por liberdade e poder para o povo preto”, disse
na ocasião.
Em outro ato que a Ponte cobriu e
Alaru estava na linha de frente, militantes
negros escracharam uma manifestação de brancos em frente ao Palácio
dos Bandeirantes, no Morumbi, zona sul da capital paulista. Os moradores da
região foram às ruas para apoiar os policiais militares que mataram o menino
Ítalo Ferreira de Jesus Siqueira, de 10 anos.
Enquanto os brancos entoavam
palavras de ordem apoiando a morte do menino, na manhã de 11 de junho de 2016,
Alaru usava uma caixa de som, acompanhado de outros militantes negros, para
dizer que estavam lá “mais uma vez denunciando e prontos para o enfrentamento
contra o povo que apoia o genocídio do povo negro”.
Em 2017, novamente o professor
estava na linha de frente das manifestações denunciando racismo no caso do
menino João Victor Souza de Carvalho, de 13 anos, que morreu em frente ao
Habib’s da Vila Nova Cachoeirinha, na zona norte paulistana, em fevereiro.
Depois de um dos protestos que
terminou com o fechamento momentâneo de duas unidades da esfiharia, no dia 1º
de abril, Alaru disse sobre a importância em “manter o enfrentamento contra
esse gigante chamado Habib’s, que é uma forma de não cair no esquecimento o
caso do João Victor e o genocídio que acontece com nossas crianças”.
Sempre preocupado com as
crianças, sonhava em construir uma escola pan-africanista na periferia da zona
leste paulistana, onde vivia. Ele deixa a companheira com quem tem dois filhos
ainda criança e outro filho de 20 anos de um relacionamento anterior.
No Facebook, a advogada Dina
Alves, que integra o IBCCRIM (Instituto Brasileiro de Ciências Criminais),
disse que “a luta pela educação e por uma sociedade antirracista perdeu um
professor”, e destacou que “a luta segue e seus ensinamentos serão lembrados”.
Nos registros, Alaru deixa a
frase que costumava puxar nas manifestações: “Racistas, otários, nos deixem em
paz”.
O professor de história e
ativista negro Alaru morreu no dia 20 de dezembro (2019), aos 43 anos. Fundador
da UCPA (União dos Coletivos Pan-Africanistas), ele esteve na linha de frente
em importantes manifestações contra o racismo.
O ativista morreu em decorrência
de problemas cardíacos. Ele ficou internado no Hospital Geral de São Matheus,
na zona leste da cidade de São Paulo, e morreu na tarde de sexta-feira. O
velório aconteceu na manhã de sábado (21/12), e o enterro à tarde, no cemitério
da Vila Formosa, também na zona leste.